a) – Conhecemos toda a sabedoria desta máxima;
porém a dificuldade está precisamente em cada um conhecer-se a si mesmo.
Qual o meio de consegui-lo?
“Fazei o que eu fazia quando
vivi na Terra: ao fim do dia, interrogava a minha consciência, passava
revista ao que fizera e perguntava a mim mesmo se não faltara a algum
dever, se ninguém tivera motivo para de mim se queixar. Foi assim que
cheguei a me conhecer e a ver o que em mim precisava de reforma. Aquele
que, todas as noites, evocasse todas as ações que praticou durante o dia
e inquirisse de si mesmo o bem ou o mal que fez, rogando a Deus e ao
seu anjo guardião que o esclarecessem, grande força adquiriria para se
aperfeiçoar, porque, crede-me, Deus o assistiria. Dirigi, pois, a vós
mesmos perguntas, interrogai-vos sobre o que tendes feito e com que
objetivo procedestes em tal ou tal circunstância, sobre se fizestes
alguma coisa que, feita por outrem, censuraríeis, sobre se obrastes
alguma ação que não ousaríeis confessar. Perguntai ainda mais: “Se
aprouvesse a Deus chamar-me neste momento, teria que temer o olhar de
alguém, ao entrar de novo no mundo dos Espíritos, onde nada pode ser
ocultado?” Examinai o que pudestes ter obrado contra Deus, depois contra
o vosso próximo e, finalmente, contra vós mesmos. As respostas vos
darão, ou o descanso para a vossa consciência, ou a indicação de um mal
que precise ser curado.
“O conhecimento de si mesmo é,
portanto, a chave do progresso individual. Mas, direis, como há de
alguém julgar-se a si mesmo? Não está aí a ilusão do amor-próprio para
atenuar as faltas e torná-las desculpáveis? O avarento se considera
apenas econômico e previdente; o orgulhoso julga que em si só há
dignidade. Isto é muito real, mas tendes um meio de verificação que não
pode iludir-vos. Quando estiverdes indecisos sobre o valor de uma de
vossas ações, inquiri como a qualificaríeis, se praticada por outra
pessoa. Se a censurais noutrem, não a podereis ter por legítima quando
fordes o seu autor, pois que Deus não usa de duas medidas na aplicação
de Sua justiça. Procurai também saber o que dela pensam os vossos
semelhantes e não desprezeis a opinião dos vossos inimigos, porquanto
esses nenhum interesse têm em mascarar a verdade, e Deus muitas vezes os
coloca ao vosso lado como um espelho, a fim de que sejais advertidos
com mais franqueza do que o faria um amigo. Perscrute, conseguintemente,
a sua consciência aquele que se sinta possuído do desejo sério de
melhorar-se, a fim de extirpar de si os maus pendores, como do seu
jardim arranca as ervas daninhas. Faça o balanço de seu dia moral, como o
comerciante faz o de suas perdas e seus lucros; e eu vos asseguro que a
primeira operação será mais proveitosa do que a segunda. Se puder dizer
que foi bom o seu dia, poderá dormir em paz e aguardar sem receio o
despertar na outra vida.
“Formulai, pois, de vós para
convosco, questões nítidas e precisas e não temais multiplicá-las. Justo
é que se gastem alguns minutos para conquistar uma felicidade eterna.
Não trabalhais todos os dias com o fito de juntar haveres que vos
garantam repouso na velhice? Não constitui esse repouso o objeto de
todos os vossos desejos, o fim que vos faz suportar fadigas e privações
temporárias? Ora, que é esse descanso de alguns dias, turbado sempre
pelas enfermidades do corpo, em comparação com o que espera o homem de
bem? Não valerá este outro a pena de alguns esforços? Sei haver muitos
que dizem ser positivo o presente e incerto o futuro. Ora, esta
exatamente a ideia que estamos encarregados de eliminar do vosso íntimo,
visto desejarmos fazer que compreendais esse futuro, de modo a não
restar nenhuma dúvida em vossa alma. Por isso foi que primeiro chamamos a
vossa atenção por meio de fenômenos capazes de ferir-vos os sentidos e
que agora vos damos instruções, que cada um de vós se acha encarregado
de espalhar. Com este objetivo é que ditamos O Livro dos Espíritos.”
SANTO
AGOSTINHO
Muitas faltas que cometemos nos passam despercebidas.
Se, efetivamente, seguindo o conselho de Santo Agostinho,
interrogássemos mais amiúde a nossa consciência, veríamos quantas vezes
falimos sem que o suspeitemos, unicamente por não perscrutarmos a
natureza e o móvel dos nossos atos.
A forma interrogativa tem
alguma coisa de mais preciso do que as máximas, que muitas vezes
deixamos de aplicar a nós mesmos. Aquela exige respostas categóricas,
por um sim ou um não, que não abrem lugar para qualquer alternativa e
que são outros tantos argumentos pessoais. E, pela soma que derem as
respostas, poderemos computar a soma de bem ou de mal que existe em nós.